Tema também tratado em vídeo pelo especialista José Julberto Meira Junior, Consultor Tributário e Mestre em Direito, disponível no YouTube neste Link.
Recentemente, por intermédio da ADC 49, no âmbito do STF, alguns dispositivos da Lei Kandir foram considerados inconstitucionais, chamando-se a atenção para a questão das transferências de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa.
Este tema já havia sido objeto de considerações anteriores por meio da Súmula 166 do STJ, bem como do Tema 1099 de repercussão geral, também no STF, e tem produzido um cenário ainda indefinido por conta da natural resistência dos Estados a tal desoneração.
Ressalte-se ainda o impacto que pode resultar para os cofres públicos, bem como a problemática decorrente que é, até o momento, em vista do art. 155, § 2º, II da Constituição Federal, de que, com a não-incidência, haja como consequência o estorno do crédito anteriormente apropriado, o que, de fato, em muitos casos, não representa real ganho para muitas situações por acabar gerando cumulatividade.
Esta tendência certamente será objeto de muita discussão e deve ser considerada pelo contribuinte, embora já discuta (a depender da concordância judicial) que não se trataria de uma não-incidência clássica e que tal estorno prejudicaria não só a cumulatividade, mas também o próprio pacto federativo e isso terá que ser discutido, pois do outro lado se sustenta que o nosso pacto federativo resultado do federalismo cooperativo e tal situação acabaria por gerar uma desorientação na neutralidade que se espera do tributo em operações interestaduais.
O fato é que a decisão, embora acertada em sua essência (sob nossa ótica) cria um desequilíbrio insanável no momento, por desestruturar um sistema construído em base de compensação mútua, prejudicando o que venho chamando de “vasos comunicantes” e ainda gerará muita discussão, o que torna fundamental a modulação dos efeitos por parte do STF.
Não é à toa que os Estados estão levantando tal situação e questionando isso e solicitando a chamada modulação “pro futuro” (2023), em ofício encaminhado ao Supremo, pois, embora seja tempo demasiado, conta-se com a habitual ineficiência do Congresso em apresentar resposta rápida a esta questão.
No referido ofício as UFs, de forma uníssona, já se asseguram previamente da determinação do não aproveitamento de tais créditos em caso de aplicação da não-incidência, em vista do citado artigo 155, § 2º, II da CF/88, como também entendem que o julgamento (embora tenha efeitos erga omnes) não é finito (logo não gerou “coisa julgada”), justamente por conta da existência de etapas complementares no devido processo, o que, de fato procede, e dá respaldo para a resistência dos Estados em acatá-la neste instante, não havendo, ainda, por tanto, o chamado trânsito em julgado do tema, o que, por sua vez, não impõe imediata ação legislativa dos Estados para operacionalizar a decisão.
Esta operacionalização dependerá de eventuais ajustes temporários feitos no âmbito do CONFAZ (acreditamos que via crédito presumido no destino), mas é tudo uma especulação, pois o que existe de certo até o momento (a partir do ofício anexado) é que as UFs aguardarão, em princípio, a solicitada modulação no STF, na esperança que a mesma dê um certo tempo de ajuste da legislação, mas isso é pura especulação técnica, assim como a potencial possibilidade de um convênio solucionando o problema temporariamente (que certamente só será considerado se houver altos níveis de judicialização de forma a justificar uma medida paliativa temporária).
Ressaltamos que já há, depois da decisão em comento, o encaminhamento de dois novos projetos de Lei Complementar, o PLP 32 e o PLP 33 (empresas do Simples) e que vão levar a discussão no âmbito do poder legiferante.
O fato é que a utilização da não-incidência apenas lastreado na decisão já proferida, pelos argumentos apresentados, será, por certo, objeto de autuação e de discussão, tornando o tema naturalmente judicializável, observando-se que em tais circunstâncias, seriam duas ações: uma na origem para garantir a não-incidência e outra no destino para garantir o potencial aproveitamento de crédito, o que torna, pelo menos a segunda, uma aventura jurídica sem precedentes ainda e isso deve ser considerado na relação custo x benefício que a mesma impõe, uma vez que gera mais transtornos neste instante.
Desta forma, considerando o cenário ainda indefinido, é importante que qualquer definição em adotar tal entendimento deverá ser precedida de avalição dos riscos e dos procedimentos, pois o tema ainda não transitou em julgado (embora a tendência seja a sua convalidação), pois há muitas consequências e desdobramentos do fato que não podem ser ignorados neste instante, recomendando-se a devida cautela.
José Julberto Meira Junior – OAB/PR 15.765 (Escritório Curitiba)